sábado, 31 de outubro de 2009

Abertura


Monte de Fralães situa-se quase no extremo sul do concelho de Barcelos, ao lado de Viatodos, Silveiros, Chavão e Grimancelos. É atravessada a nascente pela estrada nacional que liga Barcelos a Vila Nova de Famalicão e encosta-se, pelo poente, ao Monte d’Assaia, em cujo cimo nasceu.
Foi noutros tempos uma freguesia rural como as suas vizinhas, mas a sua agricultura está hoje reduzida a muito pouco.
O nome actual da freguesia é uma abreviação de S. Pedro do Monte de Fralães. Durante séculos, chamou-se apenas S. Pedro do Monte. Como, porém, toda ela se integrava nas terras de Fralães e no seu Couto e Honra, a partir de certa altura torna-se uso chamar-lhe S. Pedro do Monte de Fralães. Eliminado o orago dos nomes da freguesia, ficou a designação que é agora oficial.
Monte de Fralães não vem nas Inquirições de 1220. Não se sabe porquê, pois que o Censual do Bispo D. Pedro, de cerca de 140 anos antes, já a mencionava, como S. Cristóvão de Silveiros. Mas o texto das Inquirições de 1258 é deveras interessante. Veja-se:

D. Mendo, abade da dita igreja, jurado e interrogado, disse que o rei não é padroeiro, mas tem aí o seu reguengo, a saber, o monte da Saia, como está delimitado pela porta da cidade de Lenteiro, a seguir pela pedra que está entre o reguengo e a senra, a seguir pela Fonte Peolhosa, a seguir vai pela Valo do Capítulo até à Bouça, a seguir até ao Fojo Lobal, a seguir pela porta da Ventosa. ...
... não há aí foreiros nem honras novas ... porque é honra antiga de D. Paio Correia.


Baste-nos por agora fixar a atenção em dois aspectos: a cidade de Lenteiro e D. Paio Correia.
Através da cidade-citânia de Lenteiro, podemos mergulhar no passado do espaço em que nasceu a freguesia e outras de seus arredores; o nome de D. Paio Correia aponta o futuro, pois em Monte de Fralães muito dependeu da família deste homem. O Concelho de Fralães surgiu devido a ele e subsistiu durante meio milénio; na origem da Confraria de Nossa Senhora da Saúde também estão os Correias. Aliás, todas as terras da freguesia pertenceram a esta casa.
Da palavra Fralães não se conhece o étimo. Mas sabe-se que este topónimo teve as variantes Farlães e até Farelães. Esta última, recente, pretendia ligá-lo a farelo; para Fralães, alguém fantasiou uma impossível derivação a partir de fraga. Seria mais sério procurar um étimo gótico, talvez no nome bastante comum Fradila, que, através do sufixo –anis, dava logo Fradilanis; daí para Fralães, o caminho era rápido e seguro. Contra isto, levanta-se contudo o facto de a forma mais antiga conhecida, referida nas Inquirições de 1258, ser Farlães. Mas o Pe. Jácome Dias, em 1564, já escreve Fralães.

Imagens: Brasão e duas vistas panorâmicas de Monte de Fralães.

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Retrato da Freguesia

A Igreja Paroquial

Conforme a vemos hoje, a Igreja Paroquial de Monte de Fralães remonta à segunda metade do séc. XIX, quando foi construída a torre.
Olhando o seu interior, na capela-mor, além do indispensável altar, merece a atenção o retábulo respectivo, de invulgar qualidade para um pequeno templo de aldeia. Deve integrar-se no estilo rocaille, de quando alguém escreveu que a Confraria, a que então a igreja pertencia, era opulenta. No lado esquerdo do retábulo, vê-se a imagem de S. Pedro, o padroeiro; do lado direito, S. José. Na parede deste mesmo lado, há ainda a imagem de Santo António.
Junto ao altar e aos lados, estão o belo ambão, aquisição recente, e duas artísticas eças antigas, em pau-preto.
Recuando ao corpo principal da igreja, encontramos ao direito o nicho do Sagrado Coração de Jesus e ao lado esquerdo ode Nossa Senhora da Saúde. São uma óptima imitação neoclássica.
Um pouco mais atrás, do lado direito, olha-nos o púlpito e, frente a ele, a imagem da doutora da Igreja Santa Teresinha.
À entrada, à esquerda, fica o baptistério. Óptima também a qualidade da Pia Baptismal. Por cima fica o usual coro.
Do lado poente da capela-mor, está a sacristia e, entre esta e a torre, um pequeno salão, onde se destacam um magnífico arcaz e dois ex-votos suspensos da parede. No arcaz guarda-se, entre outras coisas, o arquivo da Confraria.
Por cima desta divisão, há um outro espaço, onde se encontram principalmente alfaias litúrgicas e uma porção de velharias.
Umas palavras mais sobre os nichos da Senhora da Saúde e do Sagrado Coração de Jesus: eles são basicamente iguais e resultaram sem dúvida duma mesma encomenda. Mas cada um deles foi pensado para a imagem que recebeu: o da Senhora da Saúde tem no «frontão» um símbolo mariano, a coroa; o do Sagrado Coração de Jesus tem no mesmo lugar os Dois Corações (o do Sagrado Coração de Jesus e o do Imaculado Coração de Maria). A cor do forro da parte posterior dos nichos também se adequa às personagens representadas. As suas imagens têm sensivelmente a mesma altura, ajustada ao espaço, mesmo sendo de materiais e qualidade diferentes.
Parece claro que estas imagens datam do mesmo tempo. A original da Senhora da Saúde terá sido então substituída e representaria a Mãe de Deus com o Menino, como se vê nos dois ex-votos da sacristia. Dessa antiga imagem, há notícia na Casa de Fralães.
Esta igreja deve certamente muito ao P.e Pedro Rodrigues, falecido em 1948. Ele ter-lhe-á renovado, por exemplo, quase todas as imagens, que estão bem longe da banalidade. Da do padroeiro, por exemplo, é conhecida uma anterior.
A do Sagrado Coração de Jesus é também uma excelente imagem. Foi oferecida por Luís Vilares, que por sinal também ofereceu um riquíssimo manto para a da Senhora da Saúde. Isto aí por 1915, no rescaldo ainda da consagração do mundo ao Sagrado Coração de Jesus, que ocorreu em 1898.
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Imagens: Igreja Paroquial, parte do retábulo do altar-mor, nichos do Sagrado Coração de Jesus e de Nossa Senhora da Saúde, imagem de S. Pedro (o padroeiro), pia baptismal.

O Adro

O P.e Pedro Rodrigues executou no adro grandes obras na década de 30 do séc. XX. Foi então que se construiu o paredão de suporte, a nascente, e o pequeno escadório. Na mesma altura deve ter sido construída a Casinha das Esmolas ou da Cera. Há umas duas dezenas de anos o piso do adro foi também beneficiado.
Quase em frente ao escadório, ainda no adro, ergue-se uma oliveira. Aquando do aterro, o seu tronco terá ficado submerso até à ramagem, mas revigorou-se e lá continua como se nada de tão estranho se tivesse passado.
Nos seus Apontamentos para a história de Santa Maria de Quintiães – Barcelos (Póvoa de Varzim, 2005, p. 529), escreve Manuel Baptista de Sousa estas palavras, que podiam ser ditas para Monte de Fralães:
Dentro do recinto do adro havia uma mesa de pedra popularmente conhecida por Pedra do Acordo ou Pedra da Paciência ou Pedra do Adro, onde se reunia, no fim da missa conventual, a Confraria do Subsino, composta pelo Juiz da terra e os homens da Fala – falou, está falado – os Homens do Acordo, eleitos todos os anos. O povo tomava conhecimento da forma de dar cumprimento às ordens do Visitador ou de as impugnar, bem como das decisões régias. Por vezes tornavam-se conflituosas essas sessões públicas sendo obrigados os Eleitos a refugiarem-se na Igreja para escapar à ira popular. Até ao sol-posto, hora imperativa da paz!

Nos registos paroquiais de Monte de Fralães há alguma memória da Confraria do Subsino. O seguinte termo de eleição de 1616 deve ter a ver com o juiz respectivo:

Foi eleito em cabido geral que se fez na forma acostumada, a última oitava do Natal, para servir o ano que vem, a Bento Gonçalves, da Porta, ao qual, tomadas as contas ao mordomo velho, foram entregues os setecentos e setenta em dinheiro, com a taleiga e o meio pau de cera. E assinou comigo, Tomé da Guarda, abade.
Tomé da Guarda.
E declaro que nesta quantia acima vão as moedas que andavam no tesouro, que se desfizeram.
B.to + Gz

A Pedra do Acordo data de 1673. A cavidade daquele assentos de pedra em redor indica acaso que eles eram a base das cruzes dum pequeno calvário.


Terreiro

Descendo do adro ao terreiro, entra-se numa área largamente arborizada onde se destacam os dois coretos e algumas mesas de pedra com os respectivos bancos. Um pequeno muro de suporte divide uma zona mais alta, a poente, duma outra, a nascente, por sua vez suportada também por um paredão erguido a partir do passal. Era aqui, uns metros em frente ao escadório, que noutros tempos se levantava a «igreja velha», a matriz trazida do cimo do monte em 1564. Uma antiga oliveira ainda guarda dela alguma memória.
Ao lado esquerdo do escadório que dá para o cemitério, ficava a residência paroquial; o lugar é agora ocupado por um salão recentemente construído a partir das ruínas da residência demolida. Mais para norte, encostado ao monte, está o Fontanário da Senhora, construído por Aires do Rio sem dúvida na segunda década de 1900.
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Imagens: Pedra do Acordo e oliveira secular, no terreiro.

Alguns lugares de Monte de Fralães

Numa freguesia há lugares que desaparecem e outros que se criam, pois a vida não pára. Os topónimos que as Inquirições de 1258 assinalam estão hoje todos esquecidos. Esquecido está também o lugar do Paço, que ficava logo no início do monte para quem ia do terreiro.
Lugares que noutro tempo tiveram a sua importância hoje não a têm, como é a Porta, o Rio, a Granja ou mesmo Urjães. Em compensação o recente lugar das Almas e o da Agra, ermos até há décadas, são agora dos mais povoados. A Granja e o Monte ganharam também importância em anos recentes.

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A escola

Durante muitos anos, a escola do primeiro ciclo do ensino básico, então escola primária, sem edifício próprio, ocupava a sala da residência paroquial. Cerca de 1960, um emigrante do Brasil, da Casa dos Silveiras, ofereceu uma escola à freguesia. Possuía uma só sala, que não havia necessidade de mais, mas tinha os requisitos então considerados indispensáveis. De notar que, ao longo do período salazarista, se foi reunindo aí uma biblioteca não desprezável.

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As Alminhas

Em Monte de Fralães há um único nicho de Alminhas. Data de 1725 e está longe de ser banal; tem alguns traços de classicismo, mas foi talvez de realização local. O painel era em madeira até há uns 30 anos; então foi substituído pelo actual, de azulejo. Tem sido um nicho muito procurado e também sempre bem zelado.
Não há nenhuma notícia sobre quem promoveu a sua construção.
Muito importante é reter que ele ficava à margem da estrada que vinha de Vila Nova de Famalicão e do Porto e que então Vila Nova de Famalicão se integrava no gigantesco concelho de Barcelos.
Consta que estes nichos se levantavam em locais onde tinham ocorrido mortes violentas. O lugar era então despovoado e por isso eventualmente propício a assaltos.

O mundo rural em mudança

Nos últimos 40 anos, Monte de Fralães, como todo o País rural, sofreu uma grande mudança. Chegou ao fim o tempo multimilenar da roca e do fuso (1), o que ainda restava dos foros; os animais de tracção foram substituídos pelo tractor, os antiquíssimos arados foram também postos de parte, o jugo artístico da tradição perdeu o seu lugar; o engenho ou nora cedeu perante o motor de rega, primeiro, e depois também ele substituído pela rega de aspersão; os homens, que até aí tinham a sua bicicleta, adquiriram motorizada e recentemente automóvel; meteu-se a energia eléctrica em casa, veio o rádio e a seguir a televisão, a habitação modernizou-se em comodidade, a roupa de vestir actualizou-se e ganhou variedade, a dependência da agricultura acabou perante uma oferta de emprego mais variada e recompensadora, instalaram-se pequenas unidades industriais, a prática religiosa esmoreceu. Os encontros entre as pessoas, que noutros tempos dependiam da vivência religiosa ou de rudimentar vida social, ocorrem agora no moderno café.
Nesta profunda mudança pesaram diversos factores, como a emigração para a França e Alemanha e a progressiva industrialização do País.
Nesta verdadeira embora lenta revolução, muitos valores se perderam e ninguém cuidou de guardar deles memória. Por exemplo, a habitação tradicional, que na freguesia em muitos casos vinha do séc. XVIII, desfigurou-se irremediavelmente, a ponto de se não justificar colocar aqui a imagem de nenhuma casa. O carro de bois destruiu-se, os jugos venderam-se ou apodreceram.
Nos anos 60, criou-se na freguesia uma fábrica, a Sibol, que manteve activa durante umas quatro décadas, chegando a empregar largas dezenas de trabalhadores, quer de Monte de Fralães quer das freguesias vizinhas.
Desde há cerca de 30 anos, o Posto da Galp, com o seu café e oficina auto, têm trazido à freguesia muita gente. O conjunto, que pertenceu originalmente a um brasileiro abastado, o «Ferreira de Chavão», foi planeado com largueza e gosto muito apreciados.

(1) Veja-se como terminou numa casa o uso da roca segundo contou na Escola C+S de Viatodos um aluno:

Quando minha avó se casou, foi viver apara uma casa onde viviam com dificuldades.
À noite, no fim do trabalho, vinham comer a sopa e depois de arrumar a cozinha, a minha avó gostava de fiar linho para ganhar um bocadinho de dinheiro.
Mas o meu avô não gostava que ela ficasse até tarde a fiar.
Um dia, em que ela nunca mais se ia deitar, ele, admirado, levantou-se e veio muito caladinho espreitar. Ela tinha-lhe vindo o sono, estava a dormir em frente à lareira com a sua rouca de linho. Ele chegou fogo à roca. Achava graça. Ela estava dormir.
Quando acordou, a roca e o linho estavam a arder e ela gritou para o marido: “Ai, lá se vai a minha roca e o meu linho!” E chorava muito.
Mas o meu avô dizia-lhe: “Acabou o teu trabalhinho!”
Mas ela continuou a fiar e agora tem muitos lençóis de linho para dar aos netos.

Helena Costa Araújo e Stephen R. Stoer, et alii, Genealogias nas Escolas: a Capacidade de nos Surpreender, Col. Ser Professor, Ed. Afrontamento, p. 62-63.

Imagens: Quinta da Porta, antiga Escola Primária, Alminhas, exemplo de renovação do parque habitacional e comercial.

Casas com história

O edifício actual do Solar de Fralães não é a casa original dos Correias. Essa ficou sem dúvida mais acima, mas quase no fundo da encosta do monte, onde houve o lugar do Paço, muito próximo da Chã, que aliás era reguenga.

Este edifício parece ter passado por um período de compeensível e acentuada ruína no séc. XIX. Ao menos é o que se deduz de certo soneto de Barbosa Campos e do que escreveu Teotónio da Fonseca.
Terá sido a Marquesa de Monfalim e seu marido quem procedeu à sua recuperação. Ao contrário do que escreveu o autor de Barcelos Aquém Alem-Cávado, a reconstrução romântica do solar aproveitou muito do que já havia. Sabemos isso pela descrição da Corografia Portuguesa e por documentos como as Memórias Paroquiais e mesmo o Livro dos Acórdãos. A torre é sem dúvida quatrocentista e igualmente o devem ser várias portas do rés-do-chão.
No século XVIII, já tinha havido obras: foi feita a sala de audiências e a cadeia. À sala de audiências chamou-se também tribunal. Da Casa da Porta chegaram até nós bastantes notícias. Era a segunda da freguesia, logo a seguir ao Solar dos Correias ou de Fralães. Em tempos recentes, tinha edifício próprio para três caseiros e ainda para o feitor. Ao tempo das Lutas Liberais já homens desta casa residiam na Rua das Flores, do Porto, então a rua chique da cidade. Nasceu nela o pianista e compositor Luís Costa.
Como uma senhora da Porta casou com um filho do médico Henrique Gomes de Araújo, senhoras da casa ajudaram aquele médico a verificar o jejum da Beata Alexandrina.
A Quinta da Porta possui um conjunto muito significativo de documentos antigos, que não estão estudados. Segundo Teotónio da Fonseca, a quinta desmembrou-se da Casa de Fralães já no século XVI.
Pelo meio do séc. XX, um filho dum caseiro da Porta entrou na ordem franciscana. Era o Pe. Manuel.

A Casa do Rio era uma casa de certa dimensão e com terrenos férteis. No século XVIII, há notícia dum Fr. Manuel aí nascido. No princípio do séc. XX, casou para lá Aires Campos, depois conhecido por Aires do Rio. Veja-se noutro lugar o que sobre ele se escreve.

Na primeira metade do séc. XX, houve duradoura rivalidade entre a Casa do Rio e a Casa da Granja. Esta casa também terá sido abastada. O edifício foi recentemente reconstruído e largamente ampliado. Houve um juiz do Couto de Fralães que era da Casa dos Silveiras; outro foi do lugar do Paço. Certamente houve juízes de outras casas, mas muitas vezes não é possível relacionar os seus nomes com elas. De resto sabe-se que os cargos municipais eram evitados pelas pessoas abastadas.
No cimo do monte d’Assaia, foi construída uma capela em honra de Nossa Senhora do Livramento aí por 1720; demoliram-na no séc. XX
No mesmo monte, houve vários moinhos de vento; ainda lá estão as construções redondas de pedra onde ficavam as mós e sobre que se enfunavam as velas. No lugar do Paço, houve um moinho a água.

Imagens: Solar de Fralães, porta antiga do mesmo solar, recibo duma renda à Marquesa de Monfalim, a última dona nobre do Solar de Fralães, lintel da antiga Casa da Porta, portal destruído da Casa dos Silveiras, lintel duma casa de Urjães (tem umas figuras em relevo), lintel de outra casa de Urjães.

O brasão e a bandeira

Em tempos recentes foi superiormente determinada a criação dos brasões das freguesias. Veja-se a descrição do de Monte de Fralães:
Brasão: escudo de prata, um monte de verde movente da ponta e rematado por torre quadrangular de negro, frestada, aberta e lavrada de ouro, entre um galo de vermelho, volvido e um crescente de azul. Coroa mural de prata de três torres. Listel branco, com a legenda a negro: "MONTE DE FRALÃES".
Bandeira: Azul. Cordão e borlas de prata e azul. Haste e lança de ouro.

Memória Descritiva dos Símbolos Heráldicos

O galo e o crescente, tendo por base o "Livro heráldico", referem-se essencialmente à questão histórica. Atributos equivalentes à bravura, vigilância e vitória sobre os Mouros.
De facto, a fundação desta freguesia é inquestionavelmente remota: são muitas as páginas interessantes que relatam a história desta pequena localidade ligada à antiquíssima "Honra de Fralães", pertença da família dos Correias, cujo primeiro senhor conhecido foi D. Paio Ramires, um Rico-Homem em Portugal, no tempo de D. Afonso VI, rei de Leão; teve como sucessor D. Soeiro Pais Correia. Conta-se que tendo este sido sitiado pelos mouros em Montemor-o-Velho e caindo em carência absoluta de subsistência, D. Soeiro Pais Correia se sustentou, durante algum tempo, das correias da sua armadura e dos arreios do seu cavalo. De facto, é bem mais provável que o apelido Correia derivasse dum cargo militar do tempo da reconquista.
A torre lembra o antigo Solar dos Correias. Durante os séculos XVI e XVII, a Casa de Fralães esteve ligada às relações portuguesas com o Oriente.
O genealogista quinhentista D. João Ribeiro Gaio evoca-a nos seguintes versos:

Fralães é o solar
Que aos Correias deu o ser,
E Dom Paio veio a ter
O qual fez o sol parar
Para os mouros vencer.

Na casa da Quinta de Fralães tiveram assento os Paços do antigo Concelho da Honra e Couto de Fralães.
O monte é facilmente identificado se tivermos em conta o próprio nome tradicional da freguesia: S. Pedro do Monte de Fralães.

Delimitação da freguesia

Pelos anos 20 ou 30 do século passado, Aires do Rio redigiu um apontamento onde abordou a questão das delimitações de Monte de Fralães. Começou por declarar:

É também pouco populosa, pois tem apenas 33 fogos, mas em área de terreno é larga como qualquer outra mais populosa.

Depois continuou:

Haverá uns quarenta anos mais ou menos que ao organizar-se a matriz predial do concelho os louvados que procederam à avaliação das propriedades da freguesia reduziram-na muito em benefício da de Viatodos, como que esta freguesia não fosse já bastante grande para caberem nela certos homens que têm por tema serem grandes à costa dos outros. (…)
Os proprietários desta freguesia desta época não protestaram com isso como lhe competia, (…)
É porém necessário fazer luz sobre este caso, para esclarecimento da posteridade – se quiserem, protestar contra esta monstruosidade.
Para dar o verdadeiro conhecimento, vou dar a directriz do marcos da freguesia, para a todo o tempo poderem reaver as terras que lhe foram usurpadas, a fim de o fazerem sem dificuldades.
Principiamos pelo marco que está no monte da Saia, próximo ao caminho, lado direito, que segue para Lagarém. Deste marco a delimitação da freguesia segue em linha recta a outro que existe no lugar do Pinsal, no alto do referido monte, e daí segue em linha recta através do Campo do Ouro – Alto do Livramento – pela encosta de Chavão, onde tem uma cruz em cima dum penedo. Daqui segue na costa de Grimancelos até aos moinhos de vento, que pertencem a Fralães. Daqui segue algum tempo entre Grimancelos e Viatodos até ao lugar da Varziela, onde existe um marco em cima da parede do prédio do Domingos da Silva Carvalho, o Leitão, com frente para o caminho que vem do lugar da Ponte para o Xisto.


Título do limite de Viatodos com S. Pedro do Monte
(Tombo de Viatodos de 1548)

Item, o limite e demarcação desta igreja de Viatodos começa a departir com S. Pedro do Monte no Regadio, abaixo da Bouça Nova, no Termindal onde acaba com S. Salvador de Silveiros e dali pela água da fonte da Barroca, que está na bouça nova de Fralães a Barroca que está da banda do poente e da dita Barroca e fonte direito à pedra da Verpilheira e da dita pedra ao marco que está na bouça da Cruz, que agora é do casal do Rio, e do dito marco direito ao marco que está no campo da Porta, que se agora pôs à riba da macieira e do dito marco direito ao penedo que está na Barroca, onde ora puseram uma cruz, e dali pelo moinho da Varziela, e do dito moinho ao marco que está no campo da Varziela e do dito marco sobe ao monte, águas vertentes para Viatodos, até ao cume da serra, onde chamam o monte da Saia, e dali a Carritel; e aqui acaba o dito limite e demarcação entre as ditas igrejas de S. Pedro do Monte com a dita igreja de Viatodos e deixa S. Pedro e começa com S. Mateus.
A qual demarcação e limite disseram e demarcaram e mostraram João Martins e João Gonçalves, de Viatodos, e Gonçalo Afonso, da Porta, e Rodrigo Afonso, da Porta, e Martinho, do Rio, e Duarte Luís, de Meleio, e Pêro Afonso da Costa, fregueses da igreja de S. Pedro, todos lavradores antigos e de boas consciências, pelo juramento dos Santos Evangelhos que lhe por mim notário foi dado e notificada a carta atrás do senhor provisor, tudo em pessoa do senhor Simão Barbosa, abade da dita igreja de S. Pedro, e do dito procurador do dito abade de Viatodos.
Testemunhas que andavam presentes: o senhor Garcia da Cunha, fidalgo da casa de El-Rei nosso senhor, e Simão de Faria, notário apostólico, e outros, e eu, Diogo Veloso, notário apostólico que isto escrevi e presente fui.
Hoje, vinte e um dias de Março de mil quinhentos e quarenta e oito anos.


Imagens: Bandeira da freguesia, Castelo de Montemor-o-Velho, placa a dar as boas-vindas pela entrada na fregusia.

TARDE DE AGOSTO

Domingo. O sol molesta,
Incendeia o horizonte.
Tocam sinos à festa
Em S. Pedro do Monte.

Num ramo de giesta
Canta um melro defronte.
É poeta: manifesta
O estro de Anacreonte.

Nos fios telefónicos
Andorinhas baloiçam...
Outras cruzam pelo ar.

E risonhos, harmónicos,
Os sinos de há pouco – oiçam! –
Repicam sem cessar.

Viatodos, 1944

Matias Lima

Neste sonetilho, a Monte de Fralães ainda se lhe chama o seu antigo e popular nome de S. Pedro do Monte.
Anacreonte foi um poeta grego do séc. V a.C.

Homens ilustres

Houve com certeza em Monte de Fralães muitos homens de que aqui se devia guardar memória. Dos quatro de que vou falar agora, resta uma base documental. E sem ela nada se pode fazer.
Deles, só um foi fralanense – Luís Costa – e esse fez a sua vida por distantes paragens. Mas guardou sempre recordação da terra natal.
O P.e Jácome Dias merece indubitavelmente a nossa atenção, pois dedicou-se de alma e coração à sua paróquia e deixou memoráveis realizações.
Aires do Rio distinguiu-se pelo seu bairrismo, escreveu e publicou ao menos um dos seus escritos.
Manuel de Figueiredo foi também uma referência para a freguesia durante muitos anos. A biblioteca que reuniu na torre de Fralães mostra que não foi de ocasião a sua ligação a esta casa.

Jácome Dias, pároco quinhentista

Em 1561, chegou a Monte de Fralães um pároco novo. E quanta necessidade dele havia! Ao longo de 50 anos, a freguesia tinha vivido numa situação irregular de esbulho. Mas agora, por iniciativa de Belchior Correia de Lacerda, o senhor da Honra de Fralães, vinha paroquiá-la um homem que certamente já dera provas da sua capacidade para pôr aqui as coisas em ordem.
A igreja, antiquíssima, continuava ainda no cimo do monte, entre as ruínas da velha «cidade de Lenteiro», como lhe chamavam as Inquirições de 1258. Ruína entre ruínas, mais «parescia casa de gado», no dizer do novo pároco.
Jácome Dias, assim se chamava ele, integrado na nova dinâmica que animava a Igreja, pôs mãos à obra para corrigir o mal feito. Mudou a igreja «à povoação», isto é, trouxe-a para o actual terreiro, dotou-a das alfaias indispensáveis, pôs-lhe um retábulo em três painéis – maneiristas, decerto, que era o que se usava –, iniciou os registos paroquiais num livro com um rosto artisticamente trabalhado e colorido e a que deu o título de Memorial dos baptizados, mortos, e casados de sam Pº do monte ab anno 1561 que foi posto pelo abade Jácome Dias... Homem empreendedor, generoso e dedicado e com certeza culto, empenhado em deixar uma marca para a história, fez por isso preceder os registos de um memorando, uma «lembrança» ou «memória» para os «que vierem depois», como escreveu.
De justiça é pois que o recordemos. Aliás, não somos o primeiro a fazê-lo; dizem-nos que já alguém o fez na revista Armas e Troféus, nº 3, de 1977.

Os senhores de Fralães

Faz sentido dedicar aqui algumas palavras aos homens que senhorearam Fralães ao longo do século XVI. O próprio P.e Jácome Dias refere vários deles, foi um que o apresentou «nesta sua igreja», culpa um outro da situação confrangedora a que ela chegara, etc.
Um «senhor» de Fralães que sai muito maltratado, supomos que com justiça, dum escrito do P.e Jácome Dias é Garcia da Cunha. Eis o que dele se sabe:
Há-de ter nascido na última década do século anterior. Era filho de Gonçalo Correia[1] e Margarida do Prado, e na família havia seis irmãos: Diogo Correia Francisco da Cunha, o próprio Garcia da Cunha, D. Maria da Cunha («mulher de Febos Moniz Repostº-mor delRei D. Manoel»), D. Isabel da Cunha e D. Leonor Correia («mulher de Martim de Tavora Mestre-sala da Rª Catholica D. Isabel»).
Vê-se que se tratou de gente paçã.
Garcia da Cunha, que não casou, foi à Índia com o irmão Francisco da Cunha, em companhia do parente Tristão da Cunha – certamente em 1506 (terá também seguido com o mesmo Tristão da Cunha, em 1514, na célebre embaixada ao Papa?). Foi apesar de tudo pai de «D. Elena da Cunha q casou com Paulo da Fonseca em Braga fazendolhe seu pae hu vinculo em Villameam junto a quinta de Farlães».
Segundo Teotónio da Fonseca, este vínculo estabeleceu-se em . Parece deduzir-se contudo da informação do P.e Jácome Dias que a essa data Garcia da Cunha já tivesse morrido.
Uma dúzia de anos antes, aquando da realização do tombo de Viatodos, Garcia da Cunha é mencionado, como se viu acima.
Diogo Correia, o seu irmão mais velho, foi quem sucedeu em Fralães. Casou com D. Isabel Pereira, filha de Álvaro Pinheiro Lobo, o velho, alcaide-mor de Barcelos, e de sua primeira mulher D. Joana de Lacerda (importantes estas mulheres, pois, mais adiante, os senhores de Fralães adoptarão o apelido de Lacerda – que delas lhes veio.)
O casal teve onze filhos: Francisco Correia (que «morreo moço»), Belchior Correia de Lacerda, António Pereira Correia, Paulo da Cunha, Gonçalo Correia da Cunha, Nicolau da Cunha (que «morreo minino»), Nuno Álvares Pereira, Álvaro da Cunha (que se fez frade crúzio), D. Maria (freira em Vila do Conde), D. Elena (freira em Estremoz), D. Margarida Cunha («Dama da Infante D. Isabel e m.er de D. Fernando de Nr.ª»).
A morte prematura de Francisco Correia não evitou que Belchior Correia de Lacerda, filho segundo, fosse à Índia. Foram também à Índia António Pereria Correia e Gonçalo Correia da Cunha; Nuno Álvres Pereira, esse finou-se por lá (ou talvez não, segundo a nota da página anterior).
Belchior Correia de Lacerda, o homem que chamou o P.e Jácome Dias, «herdou a casa de seu pae, e foi s.r da quinta e honra de Farlães». Casou com D. Isabel de Pina, filha de Fernão de Pina e de sua mulher, Guiomar de Almeida. Como não teve geração, a casa passou ao irmão António Pereira Correia.
António Pereira Correia, que, em 1527 acompanhou à Índia o governador Nuno da Cunha, foi ainda comendador de S. Miguel de Borba de Godim, junto a Felgueiras, por morte de D. João III, no ano de 1547. Casou com D. Violante de Azevedo, filha de Cristóvão Azevedo Coutinho, escrivão da Lixa, a qual ele furtou e, depois de terem alguns filhos, casou com ela.
Não obstante este princípio nada edificante, ainda teve filhas freiras, uma em Guimarães, outra em Estremoz, como aliás o P.e Jácome Dias anotou. Também nos assentos da paróquia aparecem alguns dos filhos masculinos, que foram: Cristóvão Correia Pereira, Diogo Correia de Lacerda, Manuel de Lacerda Pereira, Nuno Álvares Pereira.
Estas informações da Pedatura Lusitana confirmam e ampliam as que iremos colher dos escritos do P.e Jácome Dias.

A trasladação da igreja

Vejamos agora o seu memorando da trasladação da igreja e de como o pároco a dotou dos seus pertences:

Na era de mil quinhentos e sessenta e um, fui eu, Jácome Dias, vigário de S. Salvador de Arnoso, provido desta igreja de S. Pedro do Monte de Fralães, a apresentação de Belchior Correia de Lacerda, fidalgo e padroeiro in solidum de dita igreja, mas de pouco rendimento, porque, no primeiro ano arrendei os frutos dela a Gonçalo Álvaro, da Porta, da mesma freguesia, por doze mil réis, e por causa desta larguei a vigararia de S. Salvador de Arnoso e renunciei-a em Luís de Araújo, presbítero, morador em Braga.
Declaro, para lembrança dos que vierem depois, que um Garcia da Cunha, morador em Vila Meã, da freguesia de Silveiros, comeu os frutos dela cinquenta anos, em coroça, contratado com Simão Barbosa que fosse abade e ele comesse os frutos, e assim foi.
A qual igreja estava em cima no monte e não diziam missa senão de mês em mês. Assim se morreram estes dois e tal ficou que não tinha de seu mais que ermida no monte, que mais parecia casa de gado que igreja; tão desborratada a achei no espiritual e temporal que nem os fregueses eram curados como cumpria nem ela tinha coisa que pudesse servir. Por modo que, como esta não tinha serventia competente, nem os fregueses se enterravam nela, mas, como ovelhas sem pastor, se enterravam, em outras igrejas onde se antolhasse.
E logo, na sobredita era de sessenta e um, me foi mandado por visitações de Manuel Coelho, visitador, a mudasse à povoação, onde ora está. E mudei e fiz toda às minhas custas por os fregueses não serem mais que doze e pobres. Somente me deram seis mil réis para ajuda. E ela feita e acabada pelo ano de sessenta e cinco, por visitações, comecei a compor o retábulo que ora tem, de três painéis, scilicet, S. Pedro, S. Paulo, S. Miguel e outras pinturas no pé do retábulo de que tinha devoção. E custou-me o retábulo em branco dois cruzados, e os painéis trinta cruzados. E, para que haja memória, pus uma vestimenta de festas de damasco alaranjado com seus sabrastos de brocadilho verde. Item um cálice; pus também vaso e patena de prata, pé de latão dourado. Item pus mais um livro de missa bracarense. Um manual; uma toalha, duas francesas para os altares; pus uma pedra de ara; uma caixa pintada para os corporais; três mesas de corporais, um cendal vermelho, uma lanterna, uma caixa de couro para o cálice; um turíbulo, umas galhetas, umas vidraças na fresta. Comprei também umas âmbolas para os óleos, uma caldeira para a água benta; uma verga de ferro para a corrediça, a corrediça de linho, um frontal de gomedecil, uma caixa nova para os ornamentos; um confessionário me custou três cruzados, com dar a madeira; um escabelo ao pé do altar, uma vestimenta de chamalote nova, um catecismo, forro para o altar-mor, uma caixa de couro para as hóstias, um livro de duas mãos de papel branco para as visitações.
E, porque isto tudo passa na verdade, eu, Jácome Dias, abade desta pobre dita igreja de São Pedro do Monte, pus esta lembrança na qual declaro que não lhe achei coisa de assento, nem casa nem campo, somente o dízimo destes doze fregueses, e ainda eles pagam a Viatodos muita parte sem ter propriedade alguma que eu visse nem soubesse parte.
Assim eu levei muito trabalho, descanso para o que vier depois; mas confio que Aquele que assim o determinou me perdoará meus pecados e dará a cada um secundum opera sua.
Em Fralães, aos vinte de Janeiro de mil e quinhentos e sessenta e quatro.
Uma estante para o altar, pintada; uns tocheiros.
Jácome Dias, abade de S. Pedro do Monte.
Comecemos por notar que há erro numa das datas do autor. Ele conclui o seu apontamento em sessenta e quatro quando no corpo do texto refere já como passada a data de sessenta e cinco. Como é claro pelo registo de óbito de Belchior Correia de Lacerda, estes apontamentos foram lançados para o livro em data bastante posterior, embora existissem seguramente já em rascunho. Daí acaso qualquer erro de cópia.
Já vimos antes como em 1548, no Tombo de Viatodos, surgiam Garcia da Cunha e Simão Barbosa, os homens que aqui são responsabilizados pelo descalabro da paróquia. Belchior Correia de Lacerda não apareceu na altura. Não residiria ainda na sua honra.
Não será impossível que parte das despesas – até pelo seu volume e pelo reduzido espaço de tempo em que a obra terá sido feita – tenha sido custeada pelo senhor da Honra de Fralães, apesar do que o P.e Jácome afirma em contrário: «E mudei e fiz toda às minhas custas por os fregueses não serem mais que doze e pobres. Somente me deram seis mil réis para ajuda.»
Provavelmente, foi também Belchior Correia de Lacerda – que não tinha filhos – quem dotou a paróquia de passal e, quem sabe, de elementar residência. A igreja era «sua». O P.e Jácome Dias declara-o muito seu amigo, quando lhe escreve o registo de óbito.
O Tombo de Viatodos, que é um extenso documento, assinala propriedades da paróquia em várias outras freguesias, mas nenhuma em Monte de Fralães, como neste documento se afirma.
Cerca de setenta anos mais tarde, o pároco Pedro de Freitas lança no mesmo livro dos registos paroquiais uma relação dos bens da igreja que condiz muito de perto com a do P.e Jácome Dias.
A partir de meados do século XVIII, Monte de Fralães passou a servir-se sobretudo da capela de Nossa Senhora da Saúde, que tinha sido alargada duas vezes, que tinha rendimento próprio, que era certamente maior e mais ao gosto artístico do tempo. A igreja paroquial foi caindo em abandono. Quando o P.e João Rosa curou a freguesia, tratou de restaurá-la, notando certamente a sua valia histórica. Todavia, no dealbar da República acabou por ser demolida. Conservam-se dela algumas pedras que indubitavelmente atestam a sua antiguidade.

[1] Segundo um documento de Vilar de Frades, publicado em Joaquim Alves Vinhas, A Igreja e o Convento de Vilar de Frades, Barcelos, 1998, pág. 324: «Debaixo da torre velha obrarão os senhores de Farellães no anno de 1519 huma capella para seu enterro em que estão sepultados Gonçalo Correa, e sua mulher Dona Margarida de Prado, e sua cunhada Dona Maria de Prado senhora da quinta da Juncoza; jazem mais na dita capella Diogo Correia e sua mulher Dona Izabel e seu irmão Dom Nuno Alvares Pereira».

Nas imagens: a assinatura do abade Jácome Dias e framento duma folha dum caderno onde se assinala a venda, em 1911, dos altares e da tribuna da Igreja Velha, que é esta que o P.e Jácome Dias trasladou do monte "à povoação".

Jácome Dias, pároco quinhentista (continuação)

Publicação dos documentos do Concílio de Trento

Mas o P.e Jácome Dias deixou ainda uma outra «memória». Tem a ver com o Concílio de Trento e nela se fala desse grande arcebispo bracarense e padre conciliar que foi D. Fr. Bartomomeu dos Mártires. Vejamo-la:

Certifico eu, Jácome Dias, abade desta igreja de S. Pedro do Monte de Fralães, diocese bracarense, que hoje, domingo primeiro depois que me foi dado por Francisco Domingues, cura de Nossa Senhora de Nine, um traslado, em letra redonda, duma bula de nosso Santo Padre Pio IV, de confirmação dos decretos do Santo Concílio Tridentino, assinado do sinal do senhor doutor André Ferreira, provisor deste nosso arcebispado bracarense, e assim mais um decreto sobre os casamentos, para remédio dos grandes males e inconvenientes dos casamentos clandestinos, com a determinação do que ordenou o Santo Concílio sobre isto, e assim dos padrinhos e madrinhas, determinou não sejam daqui para diante mais que um padrinho e uma madrinha. O qual decreto vem também em letra redonda, por mandado do ilustríssimo senhor Frei Bartolomeu dos Mártires, arcebispo e senhor de Braga, e assinado por seu provisor, o qual começa: «Quando algumas pessoas se quiserem casar... etc.»
Feita primeiro procissão de acção e dar graças ao Senhor Deus por tão imensos benefícios e mercês, como nos foi mandado, à estação, na ermida de S. Nicolau da mesma freguesia, porquanto, ao presente, não dizia missa ainda na nova igreja, li e publiquei em alta voz, inteligível dos meus fregueses, a sobredita bula de confirmação dos decretos do sagrado Concílio Tridentino e mais o decreto sobre os casamentos clandestinos, e assinei os fregueses na certidão que levei ao senhor Arcebispo e ficou esta memória neste livro.
Em vinte e dois dias do mês de Outubro da era de 1564.
Os que assinaram na certidão que levei ao senhor Arcebispo foram:
O senhor Belchior Correia de Lacerda, Gonçalo Martins, Pêro Martins, António Domingues, Domingos Gonçalves, António Martins, Pêro Gonçalves, Pêro Álvares, Gonçalo Álvaro da Porta, fregueses nesta freguesia de S. Pedro do Monte da Honra de Fralães.
E porque passa na verdade, pus aqui esta certidão assinada por mim. Dia, mês, era supra.
P.e Jácome Dias

D. Fr. Bartolomeu dos Mártires, que tomou parte no Concílio de Trento, foi o primeiro bispo da Cristandade a publicar as determinações conciliares. Este documento confirmará o facto.
Em Outubro de 1564, o P.e Jácome Dias ainda não utilizava a igreja nova, que não estaria pronta. Por isso, serve-se da ermida de S. Nicolau, que corresponde com certeza à futura capela de Nossa Senhora da Saúde e actual igreja. Não passaria duma ermida e era certamente a capela particular dos senhores de Fralães.
O P.e Jácome Dias chama algumas vezes à freguesia S. Pedro do Monte, que era o seu verdadeiro nome. No documento da trasladação da igreja, chama-lhe uma vez S. Pedro do Monte de Fralães. De Fralães, pois poderia haver outras com o mesmo nome, mas que não pertenciam a Fralães. Aqui crisma-a de S. Pedro do Monte da Honra de Fralães.
O actual nome da freguesia abrevia este modo de designar.

Alguns registos paroquiais do P.e Jácome Dias

Recolhem-se de seguida alguns dos mais significativos registos do P.e Jácome Dias. O primeiro é o da esposa do seu amigo Gonçalo Álvaro, da Porta. Que já foi enterrada na igreja nova.

A 29 de Julho de 1564 se faleceu a mulher de Gonçalo Álvaro, da Porta. Jaz dentro da Igreja. Não fez manda.

A Quinta da Porta era, até há pouco, uma grande quinta, com três casas de caseiros, além da dos senhores. Escreve Teotónio da Fonseca que os seus donos tiveram no século XVI larga questão com os senhores de Fralães.
Seguindo a ordem cronológica, temos agora o registo de óbito de Belchior Correia de Lacerda:

Quarta-feira, dia de S. Bartolomeu que foi aos 24 de Agosto de 1569, se faleceu o senhor Belchior Correia de Lacerda. Não fez manda. Levaram o seu corpo a Vilar de Frades. Foi acompanhado de muita gente, e por ser no tempo de Verão, fedia muito, que não podiam suportar o grande fedor. Deus lhe perdoe, que era muito meu amigo e me apresentou nesta sua igreja.
Sua mulher, D. Isabel de Pina, se foi para o seu morgado da Guarda e se faleceu na era de 1576, a quem Deus, Nosso Senhor, tenha em seu reino. Amen.
Obviamente interessante este registo. D. Isabel de Pina, que já não seria nenhuma criança e se calhar já tinha ido à Índia, regressava agora ao seu morgado da Guarda: dentro em pouco, estará na Honra o seu cunhado António Pereira Correia. O cadáver de Belchior, esse era despachado para o Mosteiro dos Lóios de Vilar de Frades, num cortejo que não deixou agradável memória. Para não fazer manda, a sua morte terá eventualmente sido súbita.

Neste mesmo dia (14 de Fevereiro) recebi a António Jorge, índio, escravo que foi do senhor Belchior Correia de Lacerda, com Isabel Gonçalves, filha de Gonçalo Enes, lavrador de Vila de Conde. E me constou, por um assinado do vigário de Vila de Conde, dera os banhos e não haver impedimento.

Índio ou indiano, este escravo lá foi para longe. Se calhar ainda vivia D. Maria, a irmã de Belchior Correia de Lacerda que se fizera clarissa em Vila do Conde.

Aos 8 dias de 1580, recebi eu, Jácome Dias, abade de S. Pedro do Monte, a Baltasar Martins, da freguesia de Santa Maria de Viatodos, com Cecília Ferreira, criado do senhor comendador António Pereira, natural de Borba de Godim, ante o senhor Gonçalo Correia, o senhor Diogo Correia e os fregueses.

Já estão instalados os novos senhores da Honra – já o estariam há muito.

Aos 8 do mês de Outubro de 1581, entrou a senhora D. Maria, filha do senhor António Pereira e da senhora Dona Violante, no Mosteiro das freiras de Guimarães. Foram com ela, a senhora D. Violante e seus filhos Cristóvão Pereira, Diogo Correia, Manuel de Lacerda, Estêvão Ferreira e outra muita gente. Nosso Senhor a faça santa.

A Casa de Fralães deu e vai ainda dar várias vocações religiosas. Estamos no tempo mais combativo da Contra-Reforma. Os jesuítas, que havia chegado a Braga ao mesmo tempo que D. Fr. Bartolomeu dos Mártires, desde há vinte anos que tinham activo o seu Colégio de S. Paulo, para cuja fundação concorrera o próprio S. Francisco de Borja, bem como o beato Inácio de Azevedo.

Aos 8 de Julho de 1587, se foi o senhor Cristóvão para casar a Estremoz com a senhora Dona Luísa de Vasconcelos, filha de António de Pina e de sua mulher Guiomar Serrão.

Foi casar longe o próximo senhor de Fralães. Ele tivera, ou ainda tinha, por lá uma tia freira…
O segundo dos seus dois filhos vai-se fazer dominicano, tomando o sonante nome de Fr. Bartolomeu dos Mártires.
E damos aqui por concluída esta nossa «lembrança» do P.e Jácome Dias, um grande pároco de Monte de Fralães – que apanhou a freguesia da lama e lhe devolveu a dignidade.
Homem instruído, desprendido do seu, empreendedor, decerto piedoso, um anónimo da Contra-Reforma, um pároco ilustre de Monte de Fralães. Registamo-lo como um dos muitos que passaram pela freguesia, em condições tão difíceis que de um deles se conta que, indo-se embora ao fim de sete anos, nunca tinha realizado qualquer daqueles rituais que lhe podiam trazer um pequeno acréscimo de rendimento: «Nunca baptizei, nem casei, nem enterrei».

Imagens: centária oliveira do terreiro que pode ter sido madada plantar por D. Frei Bartolomeu dos Mártires e que deve indicar a direcção da porta principal da antiga Igreja Paroquial; resgisto de óbito do senhor de Fralães Belchor Correia de Lacerda.

Manuel de Figueiredo

Manuel de Figueiredo, que publicou o seu primeiro trabalho literário em 1918, pelo que dele conhecemos, há-de ter nascido no último decénio de mil e oitocentos, no Porto, de família abastada, com ascendência próxima ligada a Lemenhe. Fora seu pai quem adqui­rira a casa de Fralães, mantendo assim a família, durante muito tempo, residência no Porto e na província. Se as suas primeiras obras vieram a lume em Lisboa, lá terá Manuel de Figueiredo feito o seu curso superior e bebido ou aprofundado a influência simbolista e neogarretista que o marcará. De resto, depois de um período juvenil mais dado à literatura, Manuel de Figueiredo terá sentido a necessidade de votar o seu tempo a actividades mais comuns, pelo que, depois, a produção literária surge mais rara. Da sua produção escrita avultam claramente duas áreas, bastante próximas, complementares se poderia dizer, às quais dedicou as suas atenções de homem culto: a ficção dramática e a crítica de Artes Plásticas.
Interessado em coisas da história pátria como é timbre dos entusiastas de Garrett, facilmente se harmonizariam o exercício do cargo de director ao Museu de Soares dos Reis, a sua paixão por Henrique Pousão e por outros pintores da geração deste, a escolha do período áureo dos Descobrimentos como espaço cronológico preferido para a ficção e até o facto de ter a sua biblioteca e gabinete de trabalho instalados num dos andares da torre senhorial do antiquíssimo solar de Fralães. Manuel de Figueiredo escreveu também para revistas e jornais, embora não tenhamos nenhum conhecimento da sua produção jornalística. Não sabemos também se se lhe deve a iniciativa da colocação da estátua de Garrett frente à Câmara Municipal do Porto, posto que fosse à altura ele o vereador da cultura e tivesse proferido então uma alocução para assinalar o acontecimento.
Se bem que a vida deste homem culto se repartisse por locais e afazeres variados, o que ainda resta da sua já mencionada biblioteca na casa de Fralães mostra elucidativamente quanto ele acarinhava este posto do seu lavor intelectual.

A obra de Manuel de Figueiredo não é muito extensa, mas é certamente de apurado gosto. Apesar porém de ter privado com nomes cimeiros da cultura do seu tempo e do mérito que cremos presente na sua obra dramática, não lhe foi concedida a honra de figurar em nenhuma das duas principais enciclopédias portuguesas. De momento, parece ser o seu trabalho sobre Henrique Pousão aquele que melhor tem resistido ao desgaste do tempo. A tal não será alheio o facto de, no Museu de Soares dos Reis, Manuel de Figueiredo ter podido tão longamente meditar sobre a obra deste pintor. A capacidade pictórica, pela palavra, de que era dotado tê-lo-á tornado particularmente apto para captar os segredos dos quadros de Pousão.
Eis a lista de obras e opúsculos que Manuel Figueiredo publicou, mais ou menos cronologicamente ordenados; Oração da Raça, 1918; Infanta, 1921 (teatro); A Margem de ‘O Piedoso e o Desejado’ de Carlos Malheiro Dias, 1929; Favicha, 1935 (conto); A Monja e o Rouxinol, 1936 (narrativa); Rei Lusíada (teatro); Dois Papas – Pio XI e Pio XII, 1940; Mestre João Correia e alguns dos seus discípulos, 1949; O portuense Almeida Garrett; A linguagem dos Painéis de S. Vicente, 1956; O infante rey D. Sebastião, 1955 (teatro); Um Pintor de Leça - António Ramalho, 1959; O Barão de de Forrestier – o Homem e o Artista, 1964; O Homem que não Pregou no Deserto (teatro); O Mar (teatro); O Pintor Henrique Pousão.
Vários destes trabalhos são separatas de revistas ou textos de conferências.
A «Infanta»

«Das mais belas revelações literárias dos últimos tempos»

Sobre a «Infanta», escreveu o famalicense Júlio Brandão – provável conhecimento familiar de Manuel de Figueiredo – uma recensão critica bem elogiosa e fundamentada.
Ei-la:

«É justo que tracemos algumas linhas de referência ao volume “Infanta”, do Sr. Manuel de Figueiredo. O autor é um rapaz, o seu livro uma estreia. Mas a estreia é brilhante.
É também teatro – mas teatro que não procura os fulgores da ribalta. “Não fiz, nem quis fazer teatro”, diz o autor. “As personagens têm um sentido mais simbólico do que humano”. Isso importava pouco. No teatro grego, em Shakespeare, em Molière, em Ibsen, há figuras de um profundo simbolismo, sem deixarem de ser vivas e humanas.
Ainda há pouco dizíamos que está em voga, no momento, este teatro que não visa a representar-se, e que não sendo estático, como admitia em tempo o grande belga, todavia se não amolda facilmente às contingências e às exigências cénicas. Com «Infanta», trata-se na realidade de um poema dramático, escrito em prosa rítmica.
Passa-se na época manuelina. Cada um dos três quadros que o compõem é precedido de um desenho evidentemente intencional, e não puramente decorativo: - a cruz de Cristo, a esfera armilar, as armas portuguesas... É a apoteose das energias da raça, que a «Infanta» simboliza, em contraste com os pavores augurais e depressivos dos que tentam cobrir de crepes e de presságios o mágico esplendor da nossa Epopeia marítima – representados pelo Astrólogo, uma espécie de Velho do Restelo, que perscruta os mistérios do céu. De resto, o autor elucida que o livro é “a tragédia dum momento que passou, e a crença, a certeza num momento que há-de vir. É o triunfo eterno da Raça perante o mundo, os homens e o destino”.
Sendo assim, a “Infanta” nada a ver com D. Beatriz nem o Poeta com o autor de “Menina e moça”, cuja lenda de amores já nos deu esse incomparável “Um auto de Gil Vicente”, de Garrett.
Não nos parecia, portanto, necessária a alusão a tais personagens históricas, visto que apenas a época nos interessa, e as figuras se cortam num fundo de vitral (simbolicamente, como o autor acentua) embora modeladas com um vigor e talento notáveis. E certo que o autor nos avisa que o livro não é a história do amor do Poeta e da Princesa, ou uma evocação da corte manuelina. Por isso mesmo se nos afigura desnecessária a referência à princesa e ao poeta, como que a dar certo sabor histórico ao de luz de um pintor admirável, tudo isto no embalo rítmico duma forma deliciosamente sugestiva, em que o Sonho e a Beleza se engastam como pedras preciosas. Leitor de Maeterlinck, o Sr. Manuel de Figueiredo é inconfundível. Bebe pelo seu copo que é de cristal esplêndido. E embora um pouco tarde, não quisemos deixar de registar o volume, que é das mais belas revelações literárias dos últimos tempos».
Júlio Brandão Veja-se agora o início do II Acto desta obra, segundo a escrita arcaica nela usada:

«Uma das saltas da camara da Infanta, abrindo sobre o rio por duas grandes janellas abertas de par em par. Forram-na brocados de seda branca e oiro palido; veludos doirados cobrem os coxins. Na parede da esquerda, ao centro, sobre um estrado, uma cadeira de espaldar alto, coberta de pano de oiro, tendo por fundo uma tapeçaria armoriada e, a encimá-la, um docel de lhama. Mesa rendilhada de marfim e embutidos d’oiro, ao centro, sobre uma alcatifa oriental.
A direita e à esquerda portas cobertas por damascos brancos, brazonados. É uma salla de luar em que o outomno deixou cair as folhas.

Aias trabalham afanosas, em silencio, dobrando grandes peças de brocado d’oiro, de lhama prateada, de sedas damascadas. Outras, sentadas nos degraus do estrado, escolhem joias, que passam de mão em mão, e que a aia Leonor – pequenina como feita para o dedal – entrega á princeza. Escurece.
Uma das aias canta em surdina:

«Estava a bella Infanta
No seu jardim assentada
Com o pente d’oiro fino
Seus cabelos penteava.
Deitou os olhos ao mar
Viu vir uma nobre armada
Capitão que n‘ella vinha
Muito bem que a governava.»

INFANTA com abandono, deixando cair lentamente pedras soltas, uma a uma, na mão da aia. São como gottas de sangue estes rubis... Pedaços de céu estas saphiras... Lágrimas de estrella os diamantes.
UMA AIA acercando-se da janela aberta. Já vai anoitecendo... E’ sempre o rio o mais lindo vitral a esta hora.
INFANTA O entardecer é feito de vitrais...
A AIA Até o casario, em reflexos, parece feito de crystal.
OUTRA AIA E o luar já vem de manso. Para os lados d’alem, por traz d’aquellas serras, lia uma luz azulada, um vago clarão...
OUTRA AIA Arrefece.
á infanta
Que a aragem fresca e leve, que vem do mar a esta hora, vos não faça mal, Senhora!
INFANTA
Socegai...
Lisboa, ao luar, é uma cidade d’almas, acaricia. bruscamente
O mar, Leonor, quando fez mal?
reparando num collar de esmeraldas que a aia segura, pegando n‘elle, e passando-as uma a uma pelos dedos, como contas de um rosario, depois de um momento de silencio, como se fallasse para si, sonhando alto
Ha vagas mais verdes e mais lindas ainda que estas esmeraldas... Eu gosto das esmeraldas porque me lembram o mar. O mar é verde, sempre verde; eu nunca vi o mar azul, azul é o céu e o rio. Olhar o mar não é ir vê-lo de longe, e ir até elle, até bem junto d’elle, é vê-lo e senti-lo em cada vaga que vem bater na penedia e desfeita se espraia pela areia... É vê-lo soffrer! É vê-lo luctar! Ondas que veem, que se espraiam, que vão, que voltam, que luctam sempre, e não repousam e não descançam em eterno soffrer!
Silencio. Voltando-se para a aia Leonor
Tu tambem vês, Leonor, como os mais, o mar azul? Tu tambem crês que o mar, o verdadeiro mar, é aquelle que se estende sereno até ao horizonte distante, azul, muito azul?
A AIA Eu vejo o mar azul...
INFANTA Tu olhas o céu no mar, diz antes, mas diz tambem que nunca viste o mar.
A AIA Eu nunca soube ver como vós, Senhora!
INFANTA Por que tens medo de ir até á praia e de estar junto d’elle, como eu, quando as vagas veem umas sobre outras enormes como velhas ao vento, bramindo, rugindo... São mãos portentosas, gigantes, que se desfazem em espuma.
Nunca olhaste de frente as vagas?! Nunca as viste, Leonor, em transparencia?! Pois são verdes, mais verdes e mais lindas ainda que estas esmeraldas!
AAIA Eu nunca soube ver o mar...
depois de um silencio, procurando n‘um anel de opala os reflexos, e mostrando-a á princeza
Como é mysteriosa e tentadora! Se as pedrarias tivessem vida..., se ellas morressem..., eu diria que tinham escolhido as opalas para sarcophagos das suas cores...
OUTRA AIA Trazem desgraça as opalas. São como maus olhados... Teem fogo... queimam...
INFANTA São lindas! São phosphorescentes como o mar em noites negras!...»

«O Homem que não Pregou no Deserto»

O homem que não Pregou no Deserto podia ser a obra de um homem religioso, que o foi Manuel de Figueiredo, que no fim da vida quer deixar o seu testemunho. Mas, mesmo que seja isso, é mais do que isso, porque é obra literariamente bem trabalhada. Manuel de Figueiredo chama-lhe um «Poema dramático». Começa com um prólogo, que é uma cena num café de Lisboa, onde amigos desde há dias têm vindo a debater a questão do valor da verdade científica e da verdade religiosa. No grupo há um poeta, que é o autor da peça e que a vai terminar em breve.
Seguem-se depois quatro quadros, que são a obra propriamente dita. O primeiro é dominado pela tentativa de Salomé de se entregar de amores a João Baptista. Como João Baptista a não reconhece, é ela apenas designada por Moça. A recusa de João Baptista enfurece-a e por isso, no quadro seguinte, em duas cenas, vamos ter, primeiro, uma reunião do Conselho convocada por Herodes Antipas para que os seus conselheiros judeus dêem opinião sobre a sua intenção de degolar João Baptista. Muito salientada a cobardia destes, incapazes de se oporem ao rei. Na segunda cena, os mesmos conselheiros são convocados para assinar o documento em que se contém a decisão da decapitação de João Baptista. Vários declaram-se doentes. Em evidência de novo a cobardia destes homens, a que se contrapõe a ironia de Herodes. O terceiro quadro dá os últimos momentos da vida do Precursor, que adivinha o seu fim e não o teme. De notar o seu testemunho a respeito de Jesus Cristo. A última cena é dominada por Salomé, meia tomada de remorsos, meia louca.
Veja-se a decisiva cena da sedução de Salomé, em cuja linguagem erótica perpassam ecos do Cântico dos Cânticos:

«Vindas por detrás da mesma sebe por onde viera João, algumas moças, em grande alarido, cobertas apenas por véus, surgem e ficam junto da sebe. Só uma delas, destacando-se do grupo, parte do rosto velado, aproxima-se dançando.


A MOÇA — dirigindo-se a João. João! olha para mim. Na curva dos meus braços há abraços perdidos... No requebro do meu corpo há segredos ocultos... João! olha para mim.
JOAO — sem olhar. O Servo do Senhor não pode esmagar a cabeça da Serpente.
A MOÇA dançando sempre. As águas negras do mar de Asfalto são menos negras de que os teus cabelos negros...
Duas ametistas os teus olhos pisados. Um medronho selvagem a tua boca vermelha. João! nos meus seios rosados há leite e há mel... Favos de mel os meus seios rosados.
JOÃO A cabeça da Serpente há-de ser esmagada.
A MOÇA João! olha para mim. As árvores da floresta perfumaram os teus cabelos. As areias do deserto doiraram o teu corpo. Porque recusas apertar nas tuas mãos de sândalo o meu corpo de vime?... Ânfora de nardo em flor o meu corpo de vime...
JOÃO O fogo o purificará no bailado das chamas.
A MOÇA — com violência. Quem és tu, quem és tu que recusas a oferta do meu corpo?
JOÃO Um filho de Deus, vindo do Céu...
A MOÇA Profeta — se o és? — porque são de ametista os teus olhos pisados, de amor e desejo?
JOÃO fitando-a pela primeira vez. Os sulcos das lágrimas são vermelho e roxos.
A MOÇA aproximando-se mais. Rubra de sangue, medronho selvagem da floresta é a tua boca vermelha que eu quero morder... João, dá-me a tua boca!...
JOÃO — afastando-se e afastando-a com os braços. Mulher! O teu corpo de vime é paveia no lume. As serpentes também bailam e ardem no fogo.
A MOÇA — insistindo, aproximando-se mais. Quero morder a tua boca vermelha. Quero beijar os teus olhos pisados. Esconder as minhas mãos em garra nos teus cabelos negros. O perfume da floresta arde no teu corpo. João! dá-me a tua boca.
JOÃO violento. Falsos, traiçoeiros, horrendos, são os teus olhos verdes de serpente.
A MOÇA suspendendo a dança, irritada, altiva, ameaçadora. João! não recuses. O amor e o ódio pertencem-me por igual.
JOÃO mais violento. Maldito é o teu ódio!... Maldito é o teu amor!»

Imagens: ao cimo, primeira espsoa de Manuel de Figueiredo; depois, capas de diversas obras do mesmo.

Aires do Rio

Aires Pereira de Araújo Campos, conhecido como Aires do Rio, não era natural de Monte de Fralães. Cremos que era ninense. O seu nome documenta-se em Monte de Fralães pela primeira vez nos anos finais da monarquia. Aparece nas actas da Confraria e nas da Junta de Paróquia. Nos dois casos, transparece o seu empenhamento republicano.
Em 1909, o administrador do concelho vem em pessoa presidir à eleição da mesa da Confraria. Isso não impede Aires do Rio de enviar à mesa «cinco protestos». Dois anos a seguir, Aires do Rio integra já a mesa da Assembleia-geral. Em 1919, como «ilustre presidente da Confraria de Nossa Senhora da Saúde», propõe à Junta de Freguesia «a construção d’um braço de estrada que ligasse a estrada nacional nº 4 com o terreiro desta freguesa, onde se costuma realizar anualmente a romaria de N. Senhora da Saúde, e que, sendo essa romaria uma das maiores do Minho...» Mas não ficará por aqui a sua intervenção nos destinos da irmandade.
Entretanto, igualmente desde os anos finais da monarquia, tinha ressurgido na freguesia a questão do cemitério. Aires do Rio lá esteve na liça. Propunha-se que a igreja velha — a tal que o P.e Jácome Dias trouxera do cimo do monte — fosse demolida e em seu lugar e espaço circundante fosse instalado o cemitério. Só que isso não podia agradar ao novo senhor de Fralães, que via ali a possibilidade de obter uma entrada condigna. A questão atingiu tais proporções que acabou por ser decidida pelo Presidente da República, Bernardino Machado. Ironia máxima, a suprema autoridade republicana decidiu, em 1916, a favor dos interesses do monárquico Luís de Vilares.
O nome de Aires do Rio aparece também ligado ao Fontanário, como o do seu rival, Constantino da Granja, e o pároco de então, o Pe. Pedro, aparecem ligados ao muro de suporte do adro, às suas escada e cerca, bem como à Casinha das Esmolas.

Aires do Rio, cuja instrução não passara da primária, tinha os seus interesses intelectuais. Fazia as suas leituras e dedicou-se também a escrever. Chegou a mesmo a publicar uma História de Portugal em Verso, que não passaria do seu compêndio da primária transposto para uma redondilha muitas vezes desajeitada.
No campo da narrativa, escreveu vários livros, hoje todos perdidos, à excepção do «romance» Vingança do Tutorr.
Bairrista convicto, deixou num livrito de apontamentos um protesto contra alguém deViatodos, que deverá ser o Pe. José Garcias, que havia prejudicado a freguesia no tratamento da questão dos limites. Aires do Rio aproveita então para registar a verdadeira delimitação da sua terra adoptiva.
A Vingança do Tutor abre com uma dedicatória ao Dr. Nuno Simões, a que se segue uma «introdução», que é o prefácio. Estes dois textos ressumam a Camilo. Parece-nos contudo que esta impressão inicial é enganosa, sobretudo se levasse a esperar qualquer tipo de paráfrase ou plágio bastante ao pé da letra. De facto, Aires do Rio romanceia, ou ao menos assim aparece ao leitor, factos verídicos do seu conhecimento, o que logo o coloca perante uma intriga original. Além disso, decorrendo a segunda parte do «romance» no Brasil, que Aires do Rio conheceu, ainda mais à distância é deixada a sombra tutelar camiliana. Por este lado, aproximar-nos-íamos mais de Ferreira de Castro, cujos romances Emigrantes e A selva são anteriores à Vingança do Tutor, que é de 1937. Em nosso entender, contudo, não deve haver dependência deste para aqueles romances.
A intriga da Vingança do Tutor parte-se com demasiada clareza em duas. Cada uma delas é uma história de amor. Na segunda, contra todos os esforços do tutor da apaixonada, o amor que liga o par sai vitorioso. E entre o primeiro par e o segundo, e a ligação é só esta: o apaixonado da primeira história é o pai do apaixonado da segunda. De resto, tudo é diferente, sobretudo no espaço, já que a primeira se inicia e
Aires do Rio classifica a sua narrativa. Trata-se antes de duas novelas ou até dois contos.
Qualquer destas histórias tem passos interessantes; o tratamento dado às personagens é reduzido, mas apesar disso a história é mais ou menos convincente. O mal maior de que este livro padece, cremos que veio da incultura literária do seu autor, especialmente a nível estilístico, quando não mesmo ortográfico.
Vamos dar a palavra a Aires do Rio, que nos vai falar da evolução urbanística do Rio de Janeiro em princípios deste século. O texto que vamos transcrever vem na «quarta parte» e tem como título «A cidade do Rio de Janeiro».

A CIDADE DO RIO DE JANEIRO

Quem conheceu a cidade do Rito de Janeiro, antes do ano de mil novecentos, se lá voltasse hoje, certamente que a não conheceria. O movimento embora que já fosse grande nessa época não era para comparar com o que é actualmente, pois que apenas os bondes deram a companhia de Bota-fogo, é que já eram movidos a electricidade. As outras, a grande Companhia de S. Cristóvão, a de Vila Isabel, Engenho Novo e a dos Carris Urbanos e os do Meier ainda eram todos movidos por animais.
O serviço feito por automóveis e caminhões é todo posterior a esses anos.
Pode dizer-se, que a cidade era a primeira do mundo com respeito a trabalho.
Ali trabalhava-se quási tanto de noite como de dia. O descanso dominical só nos fins de noventa e nove é que começou, mas povo esse só muito mais tarde é que principiou a ter essa regalia, e mesmo o comércio só com a organização do horário do trabalho é que leve de executar a lei.
Mas era com esse trabalho persistente, que se conseguia arranjar e amealhar algumas fortunas.
A cidade, hoje, é completamente outra. Com a sua grande Avenida da Beira-Mar, o Cais do Porto, acostável, as grandes avenidas Passos, Rio Branco, Mem de Sá, Vila Isabel e muitas outras que não menciono, deram à cidade um certo aspecto de elegância e fidalguia, que a tornou comparável a outras cidades, capitais de grandes nações.
A retirada dos morros do meio da cidade, o encanamento do canal do Mangue, o alargamento da área da cidade até à Gávea, Laranjeiras, Madureira, Boca do Mato, Tijuca, Prainha e muitos outros lugares dos subúrbios, que dão à cidade uma área de muitos quilómetros quadrados.
A electrificação de tudo pela Companhia Light deu-lhe todas as aparências de cidade moderna e elegante.
Mas com todas estas inovações deixou de ser a terra da promissão, que foi no tempo da já célebre árvore das patacas.


Imagem: cópia dum panfleto contra Luís Vilares, certamente da iniciativa de Ares do Rio.

O Pe. João Rosa


O Pe. João Rosa assina actas da Junta de Paróquia de Monte de Fralães entre Fevereiro de 1874 e Janeiro de 1875; dos párocos desta freguesia é o único de que ficou memória de intelectual: publicou o livro de viagens sob o título de Cavalgada, deixou um pequeno livro manuscrito (que pertenceu em tempos a Matias Lima), na Biblioteca Pública do Porto guarda-se um volume, devidamente encadernado, que é uma colecção de escritos impressos de vários autores e que pertenceu ao Pe. João Rosa (consultámo-lo um dia que andámos à procura de informação sobre o Visconde de Azevedo), colaborou com Martins Sarmento na aquisição da Laje dos Sinais e da Fonte da Pegadinha e espaços envolventes e organizou o espólio do seu tio, o Abade do Louro Domingos Joaquim Pereira, autor das Memórias de Barcelos (Viana do Castelo, 1892 - este espólio guarda-se na Biblioteca da Fundação Cupertino de Miranda, em V. N. de Famalicão).
A Cavalgada saiu em 1899 em livro, em Viana, quando o Pe. João Rosa era abade das Carvalhas e depois de já ter sido publicada, ao menos em parte, no jornal Aurora do Cávado. Tem duas dedicatórias, a primeira a José Joaquim de Oliveira, de Viatodos, “velho amigo e compadre” do autor, e a segunda a Teotónio José da Fonseca, de Rio Covo (Teotónio da Fonseca, ao escrever sobre as Carvalhas, recorda o P.e João Rosa como amigo). O livro conta um passeio por algumas freguesias de Barcelos e é anterior a A ver terras, do Abade de Canidelo, Pe. Sousa Maia, que é de género semelhante, de viagens e didáctico.
Nas actas da Junta de Paróquia de Monte de Fralães, salientam-se algumas da autoria do Pe. João Rosa, como:
«Acta sobre a nomeação do secretário, tesoureiro, revisão de inventário e necessidade de acudir à sacristia da Igreja paroquial», de 22/2/74, em que se decide pedir subsídio à Bula da Cruzada para a obra e uma subscrição voluntária na freguesia; «Acta sobre a subscrição voluntária para compor a Igreja», de 10/5/74; «Acta sobre a cobrança das esmolas da subscrição voluntária para as obras da Igreja Paroquial»; «Acta sobre o requerimento de petição de esmola do Cofre da Bula»; «Acta sobre a nomeação da comissão para a confecção das matrizes», de 21/1/75. Em 1877, a pedido da Confraria de Nossa Senhora da Saúde, elaborou o inventário desta irmandade.
As actas que se referem à Igreja Paroquial são importantes, já que a igreja de então era ainda «igreja velha», que no séc. XVI tinha sido deslocada do monte d’Assaia «à povoação». Como homem de cultura, não lhe escapava a urgência de a manter com dignidade, mesmo que provavelmente já utilizasse a Capela da Confraria.
Em Setembro de 1875, já se tinha realizado a obra da Igreja e também da residência, com um gasto de 110.600 réis, tendo vindo da Bula da Cruzada 80.000 e da subscrição voluntária 30.160.
Os livros da Confraria de Nossa Senhora da Saúde também lhe mereceram judiciosas anotações.
Veja-se aqui o “Título de aquisição do “Forno dos Mouros”, assinado pelo Pe. João Rosa.

Obras na Igreja Velha

  1. Acta sobre a subscrição voluntária para compor a Igreja
Aos dez dias do mês de Maio de mil oitocentos e setenta e quatro, reunidos em sessão o Reverendo Presidente, Vogais desta Junta e Regedor desta Paróquia de São Pedro do Monte de Fralães, abaixo assinados, em presença dos chefes de família desta freguesia que previamente haviam sido convocados, ele, Reverendo Presidente, depois de mostrar seu grande interesse pela reparação da Igreja e Sacristia paroquial, declara em quanto os peritos que haviam examinado a obra, publicamente orçaram e mais a fazer-se e pintar a grande vantagem resultante de acudir agora à Igreja e Sacristia antes que o tempo aumentasse os estragos, propôs como alvitre e meio mais eficaz a seguinte subscrição voluntária:
Lugar do Rio:
Joaquim da Silva Araújo, 500 réis
Mariana Gomes, viúva, 1.300 réis
Bernarda de Araújo, solteira, 30 réis
Porta:
Simeão Maria Carneiro, 6$200 réis
Joaquim de Araújo Cancela, 1$000 réis
Urjães:
Manuel José da Silva, $500 réis
Luscos:
Francisco José da Silveira, 2$500 réis
Antónia Joaquina, viúva, 1$200 réis
Manuel de Araújo, 1$000 réis
António José de Araújo, 1$000 réis
Granja:
Manuel José de Araújo, 500 réis
Manuel Coelho de Moura, 1$500 réis
Teresa Gonçalves da Cunha $500 réis
Domingos Fernandes, $400 réis
Manuel Francisco Pereira, 1$200 réis
António Gomes da Silva, $400 réis
Monte:
Domingos da Silva Araújo, viúvo, $200 réis
João da Silva Araújo, 2$300 réis
António de Araújo, 1$000 réis
Maria Carneiro de Araújo, viúva, $500 réis
José Gomes da Silva, $500 réis
Ana Fernandes, solteira, $200 réis
Joaquina de Araújo, solteira, $400 réis
António Gomes de Faria, 1$500 réis
António José Loureiro, $400 réis
Manuel José Ribeiro, 1$000 réis
Quinta:
José Correia de Campos, 1$500 réis
Rodrigo de Araújo, 2$000 réis
Residência:
Maria de Campos, viúva, $400 réis
Soma tudo: trinta e três mil cento e sessenta réis.
Com a qual subscrição, apesar de pesada para alguns paroquianos, todos, atendendo à necessidade actual, se conformaram e comprometeram suas palavras a pagar as ditas quantias voluntariamente, a fim de com a maior brevidade se acudir às ditas urgências. E, para assim constar, se lavrou esta acta que eta Junta vai assinar.
O Presidente, o Pároco João Pereira Gomes Rosa.

Sobre a Igreja Velha na Colecção de vários apontamentos, págs. 3-4

  1. Fralães ou S. Pedro do Monte
Monte (S. Pedro) no Concelho de Barcelos, freguesia conhecida pelo nome de Fralães ou Farelães, parece que antigamente se devia escrever Fragães em razão desta antiga povoação estar situada sobre fragas: próximo à igreja ainda há hoje o lugar chamado da Fraga.
Em 1714, descia-se da porta principal para o pavimento por três escada ou degraus de pedra que entre os anos de 1715 e 1716 foram soterrados, ficando o pavimento, desde a porta principal até à capela-mor, em nível, levantando-se por nessa ocasião as paredes da igreja e arco cruzeiro proporcionalmente e reformando-se o tecto a expensas do Abade Aleixo e fregueses.
Por disforme incómoda se tirou uma antiga pia de baptismo que, junto à porta travessa, retinha a água benta e em seu lugar se colocou na parede uma pequena que actualmente serve ao mesmo mister.
Esta antiquíssima pia baptismal e depois de água benta é a que eu achei na residência e em     mandei pôr na Capela de Nossa Senhora da Saúde, para a água benta, sobre uma coluna de pedra, ao lado da epístola, junto da porta principal.

  1. Bênção da Via Crucis
Aos dezanove a dias do mês de Setembro do ano de mil oitocentos e setenta e cinco, o Reverendo João Pereira Gomes Rosa, encomendado que foi nesta Igreja de S. Pedro do Monte de Fralães, com autorização do Excelentíssimo e Reverendíssimo Senhor Núncio Apostólico neste Reino, benzeu e colocou solenemente as estações da Via Crucis dentro da Igreja Paroquial desta freguesia. E para a todo o tempo constar a sua erecção canónica, escrevo esta nota.
S. Pedro do Monte de Fralães, 9 de Dezembro de 1875.
O encomendado António Ferreira da Cunha

  1. Contas das obras na Igreja e na residência
São Pedro do Monte de Fralães, concelho de Barcelos, respeitante (ao ano de) 1874-1875.

Despesa
Parcial
Total
Extraordinária


Despendeu-se com o reconhecimento do recibo para receber o subsídio
    $200

Com perfumar e sagrar o cálice e patena da paróquia
  2$760

Com a compra do vaso para levar o Viático aos enfermos
  2$000

Com o carpinteiro António de Araújo Campos, de madeiras, pregagens para os telhados e forros e acampamento da Igreja e feitios
46$000

Com o carreiro de pedra na mesma Igreja Paroquial
 3$000

Com respaldar as paredes da mesma
   $320

Com um carreto de telha
   $900

Com desaterrar a Igreja
   $300

Com carretos de barro e saibro
   $360

Com traçar a cal
   $240

Com carreto da mesma
   $400

Com compra da mesma cal
  5$760

Com o carpinteiro Cunha, da obra feita na sacristia, jornais
  6$000

Tabuado para a mesma obra
  4$250

Ferro
  2$000

Carreto de tabuado e forro
   $200

Telha
  1$400

Carreto dela
    $500

Com o caleador da Igreja e sacristia
  7$980

Pregagens, ferragens e ganchos para a Igreja
  1$00

Com o pintor da Igreja e sacristia
12$000

Com o caixilho e vidros para a residência
  2$675

Com o caleador da dita
  2$000

Com o tabuado para a dita
  1$875

Com pregos para a dita
    $400

Com jornais aos carpinteiros da dita
  1$800

Com duplicados para os assentos paroquiais de 1874 a 1875
    $480

Com dois livros para os assentos de casamentos e óbitos
  1$100


110$600



110$600

E na sobredita forma houve a Junta estas contas por bem dadas, tomadas e aprovadas em, sessão de 18 de Setembro de 1875.
O Presidente…………… O Pároco António Ferreira da Cunha
O Regedor…………….. Manuel Coelho de Moura
O Vogal……………….. Rodrigo de Araújo
O vogal tesoureiro

Imagens a partir de cima:
Página de rosto da Cavalgada.
Títutlo da "Colecção de vários apontamentos históricos".
Uma acta da Junta de Paróquia de Monte de Fralães escrita e assinada pelo Pe. João Pereira Gomes Rosa.