sábado, 31 de outubro de 2009

Alguns lugares de Monte de Fralães

Numa freguesia há lugares que desaparecem e outros que se criam, pois a vida não pára. Os topónimos que as Inquirições de 1258 assinalam estão hoje todos esquecidos. Esquecido está também o lugar do Paço, que ficava logo no início do monte para quem ia do terreiro.
Lugares que noutro tempo tiveram a sua importância hoje não a têm, como é a Porta, o Rio, a Granja ou mesmo Urjães. Em compensação o recente lugar das Almas e o da Agra, ermos até há décadas, são agora dos mais povoados. A Granja e o Monte ganharam também importância em anos recentes.

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A escola

Durante muitos anos, a escola do primeiro ciclo do ensino básico, então escola primária, sem edifício próprio, ocupava a sala da residência paroquial. Cerca de 1960, um emigrante do Brasil, da Casa dos Silveiras, ofereceu uma escola à freguesia. Possuía uma só sala, que não havia necessidade de mais, mas tinha os requisitos então considerados indispensáveis. De notar que, ao longo do período salazarista, se foi reunindo aí uma biblioteca não desprezável.

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As Alminhas

Em Monte de Fralães há um único nicho de Alminhas. Data de 1725 e está longe de ser banal; tem alguns traços de classicismo, mas foi talvez de realização local. O painel era em madeira até há uns 30 anos; então foi substituído pelo actual, de azulejo. Tem sido um nicho muito procurado e também sempre bem zelado.
Não há nenhuma notícia sobre quem promoveu a sua construção.
Muito importante é reter que ele ficava à margem da estrada que vinha de Vila Nova de Famalicão e do Porto e que então Vila Nova de Famalicão se integrava no gigantesco concelho de Barcelos.
Consta que estes nichos se levantavam em locais onde tinham ocorrido mortes violentas. O lugar era então despovoado e por isso eventualmente propício a assaltos.

O mundo rural em mudança

Nos últimos 40 anos, Monte de Fralães, como todo o País rural, sofreu uma grande mudança. Chegou ao fim o tempo multimilenar da roca e do fuso (1), o que ainda restava dos foros; os animais de tracção foram substituídos pelo tractor, os antiquíssimos arados foram também postos de parte, o jugo artístico da tradição perdeu o seu lugar; o engenho ou nora cedeu perante o motor de rega, primeiro, e depois também ele substituído pela rega de aspersão; os homens, que até aí tinham a sua bicicleta, adquiriram motorizada e recentemente automóvel; meteu-se a energia eléctrica em casa, veio o rádio e a seguir a televisão, a habitação modernizou-se em comodidade, a roupa de vestir actualizou-se e ganhou variedade, a dependência da agricultura acabou perante uma oferta de emprego mais variada e recompensadora, instalaram-se pequenas unidades industriais, a prática religiosa esmoreceu. Os encontros entre as pessoas, que noutros tempos dependiam da vivência religiosa ou de rudimentar vida social, ocorrem agora no moderno café.
Nesta profunda mudança pesaram diversos factores, como a emigração para a França e Alemanha e a progressiva industrialização do País.
Nesta verdadeira embora lenta revolução, muitos valores se perderam e ninguém cuidou de guardar deles memória. Por exemplo, a habitação tradicional, que na freguesia em muitos casos vinha do séc. XVIII, desfigurou-se irremediavelmente, a ponto de se não justificar colocar aqui a imagem de nenhuma casa. O carro de bois destruiu-se, os jugos venderam-se ou apodreceram.
Nos anos 60, criou-se na freguesia uma fábrica, a Sibol, que manteve activa durante umas quatro décadas, chegando a empregar largas dezenas de trabalhadores, quer de Monte de Fralães quer das freguesias vizinhas.
Desde há cerca de 30 anos, o Posto da Galp, com o seu café e oficina auto, têm trazido à freguesia muita gente. O conjunto, que pertenceu originalmente a um brasileiro abastado, o «Ferreira de Chavão», foi planeado com largueza e gosto muito apreciados.

(1) Veja-se como terminou numa casa o uso da roca segundo contou na Escola C+S de Viatodos um aluno:

Quando minha avó se casou, foi viver apara uma casa onde viviam com dificuldades.
À noite, no fim do trabalho, vinham comer a sopa e depois de arrumar a cozinha, a minha avó gostava de fiar linho para ganhar um bocadinho de dinheiro.
Mas o meu avô não gostava que ela ficasse até tarde a fiar.
Um dia, em que ela nunca mais se ia deitar, ele, admirado, levantou-se e veio muito caladinho espreitar. Ela tinha-lhe vindo o sono, estava a dormir em frente à lareira com a sua rouca de linho. Ele chegou fogo à roca. Achava graça. Ela estava dormir.
Quando acordou, a roca e o linho estavam a arder e ela gritou para o marido: “Ai, lá se vai a minha roca e o meu linho!” E chorava muito.
Mas o meu avô dizia-lhe: “Acabou o teu trabalhinho!”
Mas ela continuou a fiar e agora tem muitos lençóis de linho para dar aos netos.

Helena Costa Araújo e Stephen R. Stoer, et alii, Genealogias nas Escolas: a Capacidade de nos Surpreender, Col. Ser Professor, Ed. Afrontamento, p. 62-63.

Imagens: Quinta da Porta, antiga Escola Primária, Alminhas, exemplo de renovação do parque habitacional e comercial.

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